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domingo, 29 de abril de 2018

O ESPAÇO COMPREENDIDO

Vivemos o espaço compreendido entre o já e o ainda não, ou seja: vive-se no exato momento, um estado tensional entre o antigo e o novo. Não temos senão a percepção do momento presente. Tudo que você tem depende da maneira como você olha as coisas.




O ESPAÇO COMPREENDIDO E O ESPAÇO DOMINADO

“ Nada que foi será
De novo do jeito que já foi um dia
Tudo passa
Tudo passará
(...)
Tudo que se vê não é
Igual ao que a gente viva num segundo
Tudo muda o tempo todo no mundo
(...)
(Lulu Santos, Nelson Motta)

VOCÊ É PARTE DO UNIVERSO

Repare como as pessoas vivem em grupo. As famílias não vivem isoladas, mas perto umas das outras, formando conjuntos, que são as comunidades. Você pertence a vários grupos sociais. Você é importante em cada um deles.
Convivendo em sociedade e, sendo participativo, você contribuirá para melhores condições de vida na sociedade.

ONDE VOCÊ ESTÁ?
  • A identificação de lugares é o primeiro passo para a compreensão do espaço.
  • Para identificar o espaço, tem-se que observar, não só a localização e a aparência das coisas, como também o que as pessoas estão fazendo.
  • Cada espaço sugere um tipo de atividade e de comportamento.
  • Para compreender o espaço é preciso conhecer as regras que dão identidade às paisagens.
  • Os espaços geográficos expressam as regras das relações sociais neles praticadas.
  • Diferentes tipos de atividades produzem diferentes paisagens.
  • As normas de um espaço podem ser percebidas na paisagem.
O QUE É O ESPAÇO GEOGRÁFICO?
Segundo o geógrafo brasileiro Milton Santos, o espaço geográfico é definido por dois componentes: de um lado, o conjunto e objetos naturais e de objetos resultantes da ação do homem; de outro, o conjunto de relações que definem a sociedade. O espaço, por sua vez, pode ser definido como sendo a paisagem mais a vida que a anima, a sociedade em movimento. Assim, ao se estudar uma área, tem-se que levar em conta tanto os elementos naturais – solo, clima, relevo, vegetação, hidrografia – quanto os sociais – aqueles criados pelo homem ao longo de sua ocupação. O espaço geográfico não se limita aos aspectos visíveis das paisagens. Isto significa que o trabalho humano é fator determinante da diferenciação das paisagens e da construção do espaço. Este, sim, relaciona-se diretamente com a história da humanidade.

COMO FUNCIONA ESSE MECANISMO
As fábricas produzem milhares de objetos por dia que são consumidos imediatamente, e, esses objetos consumidos, que saem das lojas, têm pronta substituição, por outros que estão saindo das fábricas. Quando os objetos saem das fábricas, todas as máquinas devem continuar funcionando, para reposição do estoque. Por isso, para que o processo não pare, a fábrica precisa ter à sua disposição, matérias-primas, máquinas, energia e trabalhadores. A fábrica, assim, ao mesmo tempo em que produz, também consome. Para supri-la, outros trabalhadores estarão em outros lugares, produzindo matérias-primas, máquinas, e até mesmo outros trabalhadores, para que não haja risco de que o processo venha a sofrer alguma interrupção. Os trabalhadores, por sua vez, além de produzirem, estão sempre consumindo, pois necessitam comer, beber, morar, tratar da sua saúde e da sua educação. Caso contrário, não podem produzir. Mas, nada disso aconteceria se as pessoas não achassem muito natural ir todos os dias às fábricas, às lojas ou à escola, ou seja, se a maneira de viver não estivesse em sintonia com o tipo de vida de cada um. Pode-se concluir que a maneira de viver de uma sociedade é a base da qual deve-se partir para entender o seu espaço.

OS TRÊS ELEMENTOS DO ESPAÇO
  1. O espaço da produção – as fábricas, as oficinas, os campos de cultivo ou qualquer lugar onde o trabalho fundamental seja de produzir algo para ser consumido. O estudo do espaço da produção se justifica como elemento fundamental da investigação geográfica, porque a forma de produção de cada sociedade determina formas de produção espacial muito particulares.
  2. O espaço da circulação – as estradas, as lojas, as ruas, as praças em qualquer lugar onde se estabeleçam relações que permitam ter acesso a bens e serviços dos quais necessitamos para sobreviver.
  3. O espaço das ideias – as igrejas, os edifícios, as escolas, os nomes das ruas, praças e cidades, a propaganda dos produtos ou das idéias, os livros, os jornais e tudo aquilo que, de uma forma ou de outra, viabiliza as relações das pessoas entre si.
Produção, circulação e ideias fazem parte de uma mesma realidade; e, pela maneira como esses três elementos se combinam, pode-se identificar a forma de funcionamento de uma sociedade e, por consequência, desvendar a dinâmica do seu espaço.

ESPAÇO DE PODER OU O PODER DO ESPAÇO?


“ O espaço geográfico é a realidade que nos cerca, as coisas que são visíveis e as que não são, como as relações sociais, seja no trabalho, em casa, na escola, etc. Este espaço compreende todas as paisagens, nos mais diferentes locais, e a ação das pessoas dos governos e das empresas sobre elas”.
Nós vivemos a nossa vida num determinado lugar, num certo espaço. Em que medida este aspecto é conhecido por nós? Conhecemos o que nele existe? Sabemos por que existem tais construções? Tal organização física? O motivo das alterações feitas na natureza? Conseguimos explicar todas estas coisas que estão construídas neste espaço? O acesso que temos ao uso dos recursos naturais, o acesso ao próprio morar e trabalhar? Este texto tem como preocupação trazer à tona a discussão do espaço, ou melhor, do conhecimento do espaço como um procedimento metodológico nos trabalhos de educação popular, na certeza de que a organização espacial que existe, expressa na localização das indústrias, nas estradas, na estrutura fundiária, na urbanização, nas divisões administrativas, nos aglomerados da população, etc... Não existe ao acaso. Pelo contrário, está inserida dentro da questão geopolítica do Estado Nacional. O espaço uno e múltiplo, por suas diversas parcelas, e, através do seu uso, é um conjunto de mercadorias cujo valor individual é função do valor que a sociedade, em dado momento, atribui a cada pedaço de matéria, isto é, cada facão da paisagem. Se o poder instituído tem o conhecimento do espaço, dos recursos naturais, para utilizá-los, de acordo com os seus interesses e necessidades, se este conhecimento é um dos elementos que lhe permite o controle sobre a organização/construção do espaço, cabe-nos também o direito e o dever de desenvolver instrumentos que nos permitem, a todos nós conhecer o espaço e ter mecanismos para tal. A análise e a compreensão do espaço para além de ser uma disciplina escolar, serve também, para instrumentalizar nossas lutas em busca de melhores condições de vida. O espaço apresenta concretamente visível o resultado da vida que ali se desenvolve, ele é a “memória” que registra fisicamente o que acontece, pois registra através de construções as mais diversas – habitações, pontes, represas, lagos, estradas, etc - e das alterações realizadas na natureza. O lugar em que vivemos apresenta certas características, tem determinados limites, tem, enfim, uma certa feição, uma aparência visível. Esta feição que lhe é própria não é algo dado pela natureza, ou que esteja ali por acaso. Pelo contrário, é resultado da construção dos homens. O espaço vai sendo modificado ao longo do tempo e estas transformações, estas modificações são resultado do próprio trabalho dos homens. É o espaço físico que deve ser entendido como a base material onde ocorrem as relações econômicas e sociais, na qual a construção/modificação do espaço é realizado no interior do processo de construção da própria sociedade. Como diz Milton Santos, se desejamos: ... “Interpretar o espaço humano como fato histórico que dele é, somente a história da sociedade mundial, aliada à da sociedade local, pode servir como fundamento à compreensão da realidade espacial e permitir a sua transformação a serviço do homem. Pois a história não se escreve fora do espaço e não há sociedade a-espacial. O espaço, ele mesmo, é social”. É um espaço socialmente construído, que além de ser condição necessária para o desenvolvimento das forças produtivas, interfere nas relações sociais. Não é mero “palco” onde se sucedem os fatos. É muito mais que isto. Entendendo que o espaço vai sendo modificado/construído ao longo do tempo, precisamos ter claro como se dá esta construção, por que ela é assim, por que são realizadas obras grandiosas, quem as quer, por que não são realizadas certas obras que à população parecem ser de tão fácil construção e que trariam muitos benefícios sociais. Isto nos remete ao fato de que a construção do espaço não é homogênea e não se dá de modo linear e contínuo (no espaço e no tempo), e nem tranquilamente  Pelo contrário, é resultado de conflitos e de contradições existentes entre os diversos grupos sociais, pois ao longo do tempo, o espaço vai assumindo as formas de materialização do processo de acumulação e reprodução do capital. Por exemplo, a construção de modernas estradas asfaltadas, de bairros residenciais de luxo, a rua mal calçada ou sem calçamento, a falta ou o não funcionamento favorável do esgoto; a coleta de lixo, o encanamento de água, a iluminação pública, etc, é a aparência que o espaço apresenta, é o resultado da construção do espaço, ao longo do tempo. Mas, esta situação deve ser analisada e compreendida dentro da perspectiva do contexto mais, como resultado da organização do espaço com fins muito específicos, embora nós, as maiorias das pessoas, não saibam para quê. Compreender a realidade supõe entender também este espaço construído/modificado, pois que ele é um dos elementos deste mundo real. É elemento visível, perceptível concretamente, através das edificações, das alterações feitas na natureza. A paisagem apresenta diversas formas que são a materialização de determinados momentos do processo de construção, na trajetória histórica da sociedade. Estas formas podem ser: um edifício, que serve para “amontoar” muitas pessoas, com apenas as condições mínimas de habitação, ou um edifício mais luxuoso com dependências extremamente sofisticadas; a existência pontes que atravessem o rio que corre por dentro da cidade; a localização de grandes indústrias de origem externa ao local, e junto ou próximo de si, bairros residenciais populares para os operários; a estrutura fundiária (forma de divisão das propriedades rurais); uma represa e o alongamento de áreas antes produtivas; o desvio de um rio; a construção de uma hidroelétrica. São formas que podem ser construídas em função de interesses das populações que vivem no local, ou independentes destas pessoas, pois elas “materializam” e explicitam as diferentes estratégias do capital. Por isso mesmo, não são formas definitivas, mas transitórias e que, para dada circunstância, são como aí estão. Entender o porquê da existência destas formas, os motivos que levaram a tais construções, a tal produção do espaço, é importante para o próprio processo de organização popular. Mas este processo de construção/modificação de espaço deve ser analisado e compreendido no interior da história de um processo maior, isto é, o local analisado faz parte de uma totalidade espacial, (o país), que deve ser considerado para não se cair em análises equivocadas. Por outro lado, a compreensão de espaço não é algo isolado, mas um dos elementos da realidade que deve ser compreendido. Sendo o resultado do próprio processo de construção, ele é resultado, ou das conquistas dos diversos grupos sociais, ou de leis, regras, definidas pelo poder público, para a viabilização dos seus objetivos, ou dos interesses que representam. No seu conjunto, esta construção do espaço, ou este espaço modificado, as forma aí edificadas, as lutas desenvolvidas, para o acesso ao solo urbano ou à propriedade rural, às melhorias urbanas, etc... Devem, portanto ser entendidas num contexto global, inteiramente vinculado às relações de classe. Daí que o local, o nosso meio, não se explica por si só, pelas aparências que apresenta. O que mais ocorre é a concretização, a reprodução, num determinado momento e num determinado espaço, da sociedade global. Entender isto é passo importante na realização do trabalho educativo – é necessário conhecer a realidade em que se está trabalhando. Assim também as pessoas envolvidas no trabalho devem ter como pressuposto que entender o seu espaço é também indispensável, é um recurso a mais de que dispõem para conhecer a sua vida, o seu mundo, e para daí se organizarem melhor. Desvendando o que vimos, não adianta só saber o que tem, como é o espaço. Por exemplo, aquele espaço muito conhecido, com o qual se convive no dia-a-dia – sabe-se como é o riacho, onde ele é mais largo, mais fundo, etc... – mas é preciso ir além deste conhecimento, que não é tão corriqueiro, é preciso colocar isto, este saber, este conhecimento no interior de um espaço mais amplo, noutra escala, entender porquê é assim, para que serve o riacho, como se apresenta, como é utilizado e a partir dele referir-se a outros rios, lagos, etc... Da região e mesmo de fora dela para verificar como se apresenta, como é utilizado e a partir dele, referir a outros rios, lagos, etc, observado o aproveitamento econômico que se faz deles, como é este aproveitamento e para quê? Acontecem muitas vezes que o conhecimento dos homens e/ou do grupo se perde, não lhe tem sentido prático, pois ao não conseguir dominar esta outra dimensão, perdem a compreensão do local, do seu meio. Existem muitos mecanismos que nos permitiriam desenvolver esta prática de conhecer o espaço em que vivemos, mas se colocados fora de nosso alcance, enquanto estranhos ao local, muitas vezes, têm a informação, conhecem o espaço e têm nele envolvidos interesses imediatos ou mesmo em longo prazo. Isto é, têm todo o instrumento necessário para conhecer o lugar e o potencial que ele possui. Por outro lado, ao mesmo tempo em que não se têm os instrumentos para conhecer o espaço, nem se tem a informação, se desconsidera que o espaço possa ser também um instrumento de poder, na medida em que o vemos apenas na sua aparência, considerando as questões técnicas e físicas, esquecendo que, além da aparência, nos interessa a essência, que é uma questão social. São os motivos que levaram a que tal espaço esteja assim. Estes motivos é que devem ser buscados. É a questão social da construção/modificação do espaço que nos interessa.

COMO FAZER ISTO?
 Na realização de um trabalho popular, incorporar na discussão do grupo a análise do espaço em que se vive é mais um dos instrumentos à disposição para o seu desenvolvimento. O empreender esta realidade vai fazer com que o próprio grupo se conheça, conheça os seus limites e os limites que lhe são impostos de fora.
Por que estes limites? O acesso ao espaço e à sua apropriação, ao lugar para morar ou para trabalhar, a melhoria da infra-estrutura do local em que se vive, são, muitas vezes, o motivo de organização popular. E estas questões são, muitas vezes, consideradas pelo poder instituído e também pela população apenas como questões técnicas, no sentido de que são desequilíbrios, desajustes que devem ser sanados, e daí, se parte para o planejamento das reformas, para a reorganização e reordenamento do território, para planos de urbanização, políticas de descentralização industrial, construções de rodovias, etc... Para dar encaminhamento às questões. Ao se desvincular a questão especial das relações de classe, transformando-as apenas em questões técnicas, caracteriza-se o fundamental do problema, os verdadeiros motivos da questão. E os problemas, quando são entendidos como do âmbito da técnica e do planejamento, apenas mascaram que o tipo de relações que existe entre os homens é o verdadeiro responsável pela qualidade de vida, pela devastação da natureza, pelo mau uso do solo, pela dificuldade de acesso do homem a terra, para morar, para trabalhar, etc. Isto deve ser entendido pelos homens e para tanto é necessário ir ao fundo das explicações para as formas aparentes no espaço, para a paisagem que se constrói. E, acima de tudo, ter claro o que adverte Lacoste: “É importante que as pessoas fiquem menos dependentes dos eixos pré-determinados e dos argumentos baseados em pretensos imperativos geográficos. É necessário que as pessoas estejam melhor armada, tanto para organizarem as suas deslocações como para expressarem a sua vontade em matéria de organização espacial. É necessário que as pessoas sejam capazes de perceber e de analisar as estratégias que estão no poder, em nível nacional como internacional. É necessário, enfim, que as pessoas estejam à altura de compreender as formas tão diversas que a crise dialética global torna consoante os locais, no seu desenvolvimento histórico e a sua diferenciação espacial em nível planetário nacional ou regional”. Um processo para se chegar a esta compreensão é através da recuperação histórica da construção do espaço. Realizando discussões a respeito do que existe no local da paisagem como se apresenta, dos problemas quase existe. Se existe uma fábrica, entender como ela se instalou ali, no local e, se a questão é proximidade com a matéria prima, qual é o tipo de matéria-prima que ali existe, como ela é retirada, por quem é retirada, quem é o proprietário, como trabalham os que desenvolvem estas e outras atividades ligadas à exploração e aproveitamento da matéria-prima, onde moram os operários que ali trabalham, como são suas habitações, como são construídas, de quem são, como pagam, para onde vai a produção ali realizada, como é transportada, como são as estradas, etc. Com referência à estrutura urbana, por exemplo, pode-se, a partir da hierarquia das cidades (megalópoles, metrópoles, etc) entrar na discussão de por que são desse tamanho, como se chegou a tal dimensão – seja em nível econômico, político ou social (Como ocorreu o crescimento urbano? Qual a sua rede urbana?) seja em nível local (sempre foi assim à divisão de terras no local? Como se chegou a tal tipo de estrutura fundiária?) Quais os imóveis que ali se desenvolvem? Como são construídos? Quem trabalha? Como? Quais os cuidados com o solo? Sempre foi assim? Para onde é destinada a produção? Como ela é encaminhada? Quem faz a comercialização? Em que condições? E ainda, no caso de analisar o bairro em que se mora, que bairro é? Como se caracteriza ? Como é a distribuição das moradias? O tamanho dos terrenos, a disposição das ruas, as praças e as áreas de lazer, o tipo de construções, a infra-estrutura urbana, como se criou e foi construído o bairro? Por que nesse local? Quem mora e por que mora no bairro? Onde trabalham? Como vão para o trabalho? Qual a importância dada ao bairro pelo poder público? E o meio ambiente? Será que os moradores locais têm visão dimensional? E o lixo? Quais as conseqüências? Para onde vai? Como são tratados os problemas sociais encontrados? O bairro e a rua são, talvez, os locais onde a população melhor se percebe criando o espaço, recriando o seu próprio mundo, são os locais onde se exercitam as relações econômicas, sociais, políticas e com a natureza, e como tal, é importantes conteúdos para se pensar em cima. A recuperação histórica da construção do local permite trazer à tona uma série de informações antes não entendidas, ou não consideradas, e que explicitam o sentido da própria vivência dos homens e, muitas vezes, os caminhos para a efetiva organização popular. São tantos exemplos que nos demonstram a possibilidade de pensar o nosso espaço. Nestes tempos é interessante recuperar a história do espaço, discutindo no sentido de entender o que existe ali, como existe, quais os motivos que levaram a esta construção. Ao fazer a história do espaço, das formas ali presentes, da paisagem, estaremos buscando os sentidos dos “quês” que os levaram a ser assim. Neste caminho se estará discutindo o acesso que cada um tem ao espaço, e como se dá a apropriação de espaço, de onde decorre a seletividade dele. Cada forma que ali existe vai remeter à discussão do espaço físico, incluindo a natureza, devendo-se ir ao fundo da discussão daqueles elementos que são importantes do ponto de vista natural e também técnico, para entender se o fundamental da questão decorre de um destes elementos ou se é do âmbito social. Segundo Yves Lacoste, mais do que uma teoria geral é necessária uma organização bem menos abstrata para que se consiga instrumentar a tomada de consciência das pessoas, e sugere que: “Para ajudar os cidadãos, nos locais onde habitam, a tomarem consciência das causas fundamentais que determinam a transparência das contradições que os atingem diretamente, é necessário, antes de tudo, fazer uma análise em termos concretos e precisos dessas contradições tal qual se manifestam em nível local, nos locais de trabalho, de habitação, tendo em conta as condições ecológicas que são, muitas vezes, um fator de transparência”. A partir daí é preciso mostrar como é que estas contradições locais se articulam e a uma situação regional, embora, muitas vezes, pareçam expressões muito locais, que nada têm a ver com o que está além do local. Em seguida, passar a análise nacional e internacional, tentando observar sempre a articulação destas análises mais abstratas. A Analise das contradições em nível regional e local, que é o que as pessoas conhecem e têm, ao menos em parte, experiência concreta. No caso de existirem movimentos populares específicos no local, é interessante verificar quais as razões pelas quais o movimento se produziu nesse local e noutros onde ele existir, e acentua ainda Lacoste: “Importa compreender porque é que o desenvolvimento das contradições é mais ou menos rápido, consoante as diversas situações que se podem distinguir num país”. Isto tudo nos remete à discussão de que, se de um lado o poder instituído, para garantir e fazer perdurar o seu poder, organiza o espaço, conforme lhe interessa, e tem e/ou cria mecanismos para tal. De outro lado, os diversos grupos devem pelo menos fazer um esforço para conseguir compreender este fenômeno, para poder reagir, para não ser passivo. Só conhecendo o espaço, com os olhos voltados não apenas para o local, mas a partir do global, se poderá articular a luta para a conquista do solo urbano (habitações decentes com a infra-estrutura mínima, ao menos, para viver em condições humanas). Do mesmo modo que no espaço rural, para exigência de reformas, e para que estas não sejam apenas superficiais, considerando os problemas individualizados, mas que sejam o mais abrangentes e profundas possíveis. E, finalizando, nunca é demais repetir que o espaço não é mero “palco” onde se sucedem certos fenômenos, mas que ele é construído socialmente e que, segundo Andrade: "O processo de produção de um espaço para alguns e não para todos, a sociedade, estudada no poder político do Estado, organiza o território, visando utilizá-lo de determinadas formas e com determinadas formas e com determinados fins. Procurando maximizar a utilização do espaço, a sociedade, tinha sob a égide do Estado, via aperfeiçoando cada vez mais as formas materiais e sociais da utilização do território e estas transformações nos meios nas técnicas, vão provocar consequências que levem à necessidade de reformulação dos fins a serem atingidos. E estes se reformulam em função do jogo de interesses, de pressões e de poder existentes entre classes e grupos sociais”. Se conhecer o espaço representa poder, nós teremos que fazer com que tenhamos os mecanismos necessários para que cada vez mais e mais gente possa conhecer o seu espaço e entender o que ele representa, pois o importante é “saber pensar o espaço para saber nele se organizar, para saber nele combater”. Lacoste. Entender o sentido de “espaço” é o nosso objetivo maior, pois, a partir deste conhecimento, nós seremos capazes de construir um mundo melhor, com melhores condições de vida. Por fim, paisagem e espaço não são sinônimos. A paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza. Já o espaço são essas formas mais a vida que as anima.

O ESPAÇO EM CONTEXTO
Um dia, um rico pai de família levou seu filho para viajar, com o firme propósito de mostrar quanto as pessoas podem ser pobres.
Eles passaram um dia e uma noite na casa de uma família muito pobre.
Quando retornaram da viagem, o pai perguntou ao filho:
- Como foi a viagem?
- Muito boa, papai!
- Você viu como as pessoas pobres podem ser? – o pai perguntou.
- Eu vi que nós temos um cachorro em casa e eles têm quatro. Nós temos uma piscina que alcança o meio do jardim. Eles têm um riacho que não tem fim. Nós temos uma varanda coberta e iluminada com luz elétrica. Eles têm as estrelas e a lua. Nosso quintal vai até o portão de entrada. Eles têm uma floresta inteira.
Quando o garoto estava acabando de responder, seu pai ficou estupefato. O filho acrescentou:
- Obrigado, pai, por me mostrar quanto “pobres” nós somos!

MORAL DA HISTÓRIA - Tudo que você tem depende da maneira como você olha as coisas.


BIBLIOGRAFIA
CALLAI, Helena Copetti; in Contexto e Educação, Universidade de Ijuí, Ano I, n. 3, julho/set. 1986
PEREIRA, Diamentino Alves C. et alli, Geografia Ciência do Espaço. SP, Atual Editora, 1988.
PITTE, Jean-Robert; Geografia a natureza humanizada, FTD, 1998
ANDRADE, M.C.de, Estado, Sociedade e Produção do Espaço. In: Simpósio teoria e ensino da Geografia – textos para discussão. Belo Horizonte, 1983.
LACOSTE, Y, A Geografia serve antes de mais nada para fazer a guerra. Lisboa, Iniciativas Editoriais, 1977.
SANTOS, M., Espaço e sociedade: ensaio, Petrópolis, Vozes, 1979

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