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sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

INQUISIÇÃO NAS TERRAS TUPINIQUINS

Houve um tempo em que cultivar ervas para fazer remédios e estudar os astros era muito perigoso. Praticantes da chamada artes ocultas, eram perseguidos, torturados e mortos na fogueira. O assunto bruxaria é abordado inúmeras vezes tanto na literatura quanto no cinema, mas sempre focando acontecimentos ocorridos na Europa ou nos Estados Unidos. O que pouca gente sabe é que queimar pessoas na fogueira sob a acusação de bruxaria também foi uma prática que ocorreu aqui no Brasil Colônia.



A nossa história esconde algo sombrio e sinistro: a caça às bruxas em Salém(EUA). Muitas mulheres acusadas de feitiçaria foram caçadas e assassinadas nesse período. Na idade média houve mais mulheres do que homens sendo condenados, e a pena  era morrer na fogueira, queimados vivos, pois só assim poderiam pagar por seus pecados. A Igreja também fez suas vítimas em terras tupiniquins entre os séculos XVI e XVIII. O poder religioso no Brasil era exercido pela Igreja Católica, ficava sob responsabilidade dela investigar as acusações de bruxaria, embora ela não tenha sido a única responsável por suprimir o que considerava heresia. Em alguns países protestantes, como a Alemanha, essa prática também existiu. Para a Igreja Cristã, toda e qualquer crença que não seguisse seus dogmas era considerada herege. Toda divindade pagã passou a ser considerada demoníaca e seus devotos tinham duas opções: abandonar sua fé e se converter ou encontrar a morte. 
Por aqui não foi muito diferente, no Brasil um total de 1076 pessoas foram investigadas, sendo que 29 foram levadas à fogueira, homens e mulheres.  As acusações se sustentaram em práticas que se baseavam em um misto de sabedoria popular, utilização de recursos naturais para o tratamento e cura de doenças, adoração de entidades estranhas à Igreja ou o simples fato de se discordar dela. Alguns casos que foram considerados como “bruxaria”, ficaram evidentes as reais intenções dos acusadores. O Tribunal nunca foi instaurado, ainda que tenham ocorrido três Visitações do Santo Ofício às terras brasileiras. Os “Visitadores”, que eram os enviados de Portugal pelo Tribunal com o intuito de averiguar algum tipo de acusação, estiveram apenas nas capitanias prósperas na época: Grão-Pará, Pernambuco e Bahia. A caça às bruxas ficou a cargo do clero local. Ainda assim algumas mulheres acusadas de “bruxaria” conheceram a morte na fogueira da “Inquisição”.  Não muito diferente dos dias atuais, naquela época, ao se deparar com o termo bruxaria o povo logo imaginava pessoas que manipulavam energias malignas e mantinham algum tipo de contato com demônios, mas conforme veremos a seguir, os casos passavam longe disso.
a demonolatria serviu como uma justificativa criada pela Igreja Católica para combater os antigos costumes, ritos e mitos pagãos, presentes ainda na sociedade europeia do período medieval, a demonolatria associava desta forma os deuses pagãos ao Demônio.


A demonolatria serviu como uma justificativa criada pela Igreja Católica para combater os antigos costumes, ritos e mitos pagãos, presentes na sociedade europeia do período medieval. Associava desta forma os deuses pagãos ao Demônio. Tem-se que estabelecer a distinção entre feiticeira e bruxa. A feiticeira era a mulher que utilizava práticas e artifícios misteriosos para curar doenças, adivinhar o futuro e obter benefícios na área amorosa, comercial, social, etc. As bruxas eram as mulheres que possuíam pacto com o Demônio, o que as tornava mais perigosas que as feiticeiras, eram consideradas irrecuperáveis, pois eram um instrumento do mal entre os homens.
As bolsas de mandinga ou patuás foram a forma de feitiçaria mais típica da Colônia. Todas as camadas de todas as regiões do Brasil as utilizavam. Serviam como talismãs de proteção, amuletos de sorte. Foram formas de magia sincrética: misturavam hábitos culturais europeus, africanos e indígenas. A maioria dos curandeiros eram homens africanos, índios e mestiços. O curandeirismo colonial atrelava o conhecimento de ervas e procedimentos rituais de origem indígena e africana à medicina popular europeia. 


Vamos conhecer algumas "bruxas" tupiniquins.

Mima Renard 

Em 1692 Mima Renard e seu marido mudaram-se da França para o Brasil e acabaram se instalando na ainda Vila de São Paulo. Mima era uma mulher muito bela e talvez essa tenha sido sua maldição. Ela despertava a cobiça dos homens e, consequentemente, a inveja das mulheres da vila, tanto que seu marido foi assassinado. O acusado pelo crime foi um homem, casado, que pretendia abandonar a família e toma-la como esposa. Sozinha, sem ter como se manter, Mima foi levada à prostituição. Uma mulher tão desejada pelos homens, agora sendo uma prostituta, levou a comunidade masculina ao delírio e, claro, o ódio das mulheres pela francesa aumentou ainda mais. Mima tinha tudo para ter uma vida confortável, porém uma crise de ciúme entre seus clientes (ambos casados) resultou em novo assassinato. Diversas pessoas se queixaram ao padre local sobre Mima, acusando-a de usar feitiços que enlouqueciam os homens e, como resultado, a bela francesa foi queimada viva. 

Isabel de Alvarenga 

Em 1750 foi aberto um processo acusando Isabel Pedrosa de Alvarenga de “bruxaria”. A acusação partiu de um dos “familiares do Santo Ofício” (como eram chamados os espiões da Igreja). Segundo ele, Isabel carregava um saco contendo umbigos de crianças, tufos de cabelo, panos ensopados de sangue, bicos de pássaros e toda espécie de material bizarro que seria utilizado para a prática de feitiçaria. Na verdade Isabel nada mais era do que uma mulher pobre que vivia nas ruas à custa de esmolas. Mesmo sem jamais admitir estar envolvida com a prática de “bruxaria”, foi condenada à morte. 


 Páscoa, a escrava paulistana

Em 1750 um juiz assinou a sentença em que acusava uma escrava paulistana, chamada Páscoa, de bruxaria. Segundo o Santo Ofício, ela utilizava fios de cabelo, pedaços de unhas e até mesmo fezes humanas não apenas para fazer feitiços de amarração, benzimento ou cura, mas para matar. Consta dos autos que Páscoa fizera um pacto com o diabo e fora responsável pela morte de cinco pessoas. Em 30 de julho daquele ano o caso foi encaminhado à Inquisição, em Portugal, porém o paradeiro de Páscoa até hoje é desconhecido. 

Ursulina de Jesus

Em 1754, Ursulina de Jesus, casada com Sebastião, figura bastante importante na região, foi acusada pelo próprio marido de praticar “bruxaria”. Segundo ele, a esposa fazia feitiços para retirar-lhe a virilidade e assim evitar que tivessem filhos. No processo aberto pela Igreja, por incrível que pareça, consta o depoimento de Cesárea, a amante de Sebastião, confirmando seu insucesso sexual. Dois anos após Ursulina ser morta na fogueira, Cesárea e Sebastião se casaram, sem nunca terem tido filhos.

Maria da Conceição 

Em 1798, a acusada da vez foi Maria da Conceição. Era conhecida na vila de São Paulo por preparar poderosos remédios e poções para atrair o sexo oposto. O sucesso dos seus produtos era tamanho que ela passou a gozar de certa reputação. Porém, por algum motivo desconhecido, ela ganhou a antipatia de um padre, chamado Luís, e logo a acusação de heresia e bruxaria caiu sobre ela. Devido ao fato de que o Brasil era colônia de Portugal, a lei portuguesa contra a feitiçaria foi usada no julgamento, e Maria foi considerada culpada e condenada à morte na fogueira. Maria foi queimada viva em uma fogueira próxima ao Convento de São Bento, no centro de São Paulo. 

Adelaide Quintana 

Viúva, ela herdara a fortuna de seu marido e, por não ter filhos, tinha uma vida solitária. Para dar um propósito à sua vida ela passou a levar para casa crianças que encontrava na rua. Lá elas eram alimentadas e ganhavam roupas novas. Geralmente essas crianças eram filhas de operários. Não se sabe quem fez a denúncia, mas chegou ao conhecimento da paróquia regional que Adelaide atraia as crianças para sua casa com o intuito de coletar seu sangue, lágrimas e cabelo para a realização de “bruxarias. Foi condenada a fogueira. 

Bárbara dos Prazeres 

A bruxa do arco de Telles. A mais famosa bruxa das terras tupiniquins. Nasceu em Portugal e, aos 18 anos, veio para o Rio de Janeiro, acompanhada pelo marido, lá pelos idos de 1788. Bárbara era uma mulher muito bonita e chamava a atenção de todos que a fitavam. Ela matou o marido a golpes de faca e passou a viver com seu amante, que teve o mesmo destino. Sem dinheiro virou prostituta e com a idade avançando, ela raptava meninos de rua, filhos de escravos ou mendigos, dopava as crianças com ervas e depois de entorpecidas, eram penduradas de ponta cabeça e sangradas, até a morte. O sangue era recolhido num balde, que serviria de material para um banho ritualístico de rejuvenescimento. O fato é que a Bruxa Bárbara dos Prazeres tornou-se a meliante mais procurada da cidade. Nunca foi encontrada. 

Clique e conheça um pouco sobre a história de Bárbara dos Prazeres 


As acusações de heresia e bruxaria movidas a essas mulheres ocorreram por motivos que nada tinham a ver com o que podemos denominar bruxaria. Mulheres que sofriam essas acusações normalmente eram lavadeiras de mortos, curandeiras, parteiras ou adivinhas, típicas profissões femininas da época, mas de pouco prestigio. Mas há casos em que a Igreja não agiu apenas por motivos políticos ou particulares. Em Portugal a sentença mais comum imposta a quem fosse acusado de bruxaria era o exílio no Brasil, de forma que o país ficou repleto de benzedeiras e milagreiras e, cá entre nós, essas práticas estão distantes de serem consideradas obras do demônio. 
Como sempre aconteceu, as práticas mais abomináveis promovidas pela Igreja foram justificadas como sendo formas de liquidar todo tipo de pensamento contrário aos seus dogmas, pelo bem da humanidade, salvação da alma e em nome de Deus, mas no fundo atendiam a interesses bem menos nobres, principalmente quando estavam em jogo a riqueza e o poder. Teriam essas mulheres sido queimadas vivas se fossem nobres damas da sociedade? Hipocrisia e interesse, assim como a ignorância, não são males inerentes aos tempos atuais, eles existem desde o início da civilização.  Se na época em que mulheres como Mima, Adelaide, Ursulina, Isabel e Páscoa foram acusadas de bruxaria ligá-las ao satanismo já era simples fruto de ignorância e, consequentemente, preconceito, o que dizer dos dias de hoje? 


A Ignorância de um povo 

Essa última história foi um caso bem recente que chocou por sua crueldade e ignorância. 

Fabiana Maria de Jesus não foi acusada formalmente de bruxaria como as outras mulheres desta lista, mas foi “julgada e condenada” covardemente por populares por causa de um boato sobre magia negra. A história de uma mulher que sequestrava crianças para realizar rituais de magia negra circulou na internet como sendo verdadeira, com direito até a retrato falado da suspeita. Tudo não passava de um boato, mas Fabiana de Jesus, de 33 anos, foi vista dando frutas para um garoto em Guarujá (SP), e a mãe do menino a achou parecida com a imagem do retrato falado. Cerca de 100 pessoas que estavam nos arredores lincharam Fabiana, que morreu segurando uma Bíblia. Posteriormente foi provado que ela era inocente. O fato aconteceu em 3 de maio de 2014, e cinco dos acusados de linchamento foram presos. O líder da agressão foi condenado a 30 anos de prisão.

Em Belo Horizonte existe o Museu da História da Inquisição, único do país sobre o tema. O acervo composto por 350 livros e 150 objetos, como réplicas de instrumentos de tortura e roupas da época, painéis contando a trajetória desde o início do período inquisitório. Em Minas, a primeira visita oficial de inquisidores se deu em 1591 e o fim só ocorreu em 1821.
http://www.museudainquisicao.org.br


4 comentários:

  1. Que legal, na escola nunca estudei sobre a inquisição no Brasil e muito menos sabia houve morte de bruxas por aqui. Esta tal de Barbara dos Prazeres era um tipo de Hannibal Lecter.

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  2. Adorei saber sobre a diferença de bruxa e feiticeira. Sou uma feiticeira

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  3. muito bom seu blog, tem excelentes artigos Parabéns!

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  4. no brasil tudo é falso, imitação até as bruxas.kkkkkkkkkkkkkk

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