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segunda-feira, 24 de setembro de 2018

O CANTO DA CIGARRA

Dias após o equinócio da primavera, as primeiras chuvas umedecem o solo que estava seco e o aumento da temperatura despertam as ninfas das cigarras que estavam vivendo dentro da terra, em estado quase letárgico a sugar a seiva das raízes das árvores. Nas noites quentes e úmidas o verão é pronunciado durante o solstício. 

Numa tarde de verão, escuto o estridente som das cigarras e lembro-me de minha avó, moradora de uma fazenda nas montanhas de Minas, dizendo: - “Menino para de assobiar vai explodir que nem as cigarras”. Eu ria e tentava explicar que as cigarras não explodiam, mas sim trocavam de “roupa”. Com toda simplicidade ela respondia: _ “Tá, então me fala quem é a costureira delas”.

As ninfas da cigarra, de carapaça dura, ou, como preferem os entomólogos – exoesqueleto-, cavam túneis que as levam à superfície. Esses pequenos buracos são a saída final para um mundo completamente novo a ser descoberto. No entanto, as ninfas só saem à noite, quando seus predadores dormem sobre os galhos daquelas mesmas árvores. É aí que começa o espetáculo. 
Como velhos e aposentados caminhões 4X4, auxiliadas em poderosas pernas traseiras repletas de espinhos, vão subindo qualquer superfície vertical que encontra pelo caminho. Seja um tronco de uma árvore ou uma parede, nada a impede de seguir em frente. Após uma longa, lenta e cansativa escalada de alguns metros, as ninfas param. Ficam ali, penduradas ao léu, estáticas. Pouco a pouco, e magicamente, uma fenda aparece ao longo das costas da ninfa, e por ali vai emergindo o indivíduo adulto. Primeiro surge a cabeça com os enormes olhos. 


Depois parece que o corpo mole do adulto escorrega vagarosamente pelo exoesqueleto até liberar as pernas. Finalmente, já fora da carapaça, mas agarrado a ela, as asas começam a inflar até se formarem completamente. Este processo é denominado Ecdise, O processo de muda funciona em termos bastante simples como uma “troca de roupa”. A cutícula do corpo da cigarra é digerida por fluidos enquanto que a epiderme secreta uma nova cutícula. Após a digestão completa do velho exoesqueleto a cutícula original se fratura no meio e o inseto emerge. Uma nova exocutícula (cutícula externa) passa por um processo de “secagem” após a muda. Esse processo torna o corpo da cigarra mais rígido. 


Todo esse processo pode durar horas, e é chamado de metamorfose incompleta, que é o termo que se usa quando a ninfa é muito parecida ao adulto, mas sem asas e sem órgãos reprodutivos maduros. Isso é diferente da conhecida metamorfose completa típica das borboletas, quando existe uma forma larval e um estágio de pupa, totalmente diferentes do adulto. Mas é durante o alvorecer do dia, e quando o sol está a pino e também na boca da noite que sentimos a presença destes adultos. Em todo o centro sul-sudeste do Brasil, nos meses de dias quentes de outubro e novembro, os machos das cigarras adultas emitem seus vigorosos e estridentes, cantos nupciais. O som de algumas destas espécies pode atingir até 120 decibéis, o que já é classificado na faixa de som ensurdecedor. Para termos uma ideia, é comparável ao barulho do decolar de um avião de grande porte. Quanto ao fim ou utilidade do ruído: representando, evidentemente, um caráter sexual, é de crer que também desempenhe papel saliente na aproximação dos sexos. Tal aparelho é ausente ou pouco desenvolvido nas fêmeas. 

O tempo de vida de uma cigarra adulta é bastante curto, em geral algumas semanas. Dependendo da espécie pode viver 2 meses. As fêmeas põem seus ovos e morrem logo depois. Na fase de ninfa elas podem viver anos, às vezes 2, às vezes 17 anos debaixo da terra, numa vida que consiste em apenas sugar a seiva das raízes que a cercam. Mas quando chega a hora de se transformar num adulto, tudo muda. Na fase adulta ela tem a oportunidade de voar, cruzar os céus, enfrentar a liberdade da vida em todo o seu fulgor. Mas nada é de graça. Essa vida dura não mais do que poucos dias. Além disso, há perigos por toda parte, e o maior deles são os predadores. Entre estes, as aves são os mais vorazes. O pouco tempo de vida das cigarras adultas faz com que elas tenham que agir rápida e assertivamente. Precisam atrair uma fêmea o mais rápido possível, antes que um desses predadores vorazes a transformem em refeição. Assim, cantam o mais alto possível durante o máximo de tempo possível. É um jogo perigoso. Além de tentar atrair uma parceira, os pobres machos precisam ficar em constante estado de alerta. Cigarras machos costumam copular com outros machos ou com cadáveres de fêmeas. 


É, não é fácil ser uma cigarra!
Na agricultura, a cigarra é considerada uma praga, sejam porque as ninfas diminuem o fluxo de seiva nas raízes, ou porque os adultos necessitam danificar as folhas ou galhos finos para depositar seus ovos. Nas fábulas, Esopo e La Fontaine colocam as cigarras injustamente como insetos preguiçosos. Nas cidades,  as pessoas pedem a cabeça das cigarras por serem barulhentas e irritantes.  Nas matas, os pássaros  fazem dela uma guloseima apetitosa.  A cigarra lembra-me os pilotos Kamikazes da 2ª Grande Guerra, para seu voo de morte.


3 comentários:

  1. adoro o canto estridente das cigarras,,.. lembra o interior, a fazenda, a infância

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  2. Que resumo maravilhoso bem apricado lembrar minha infância

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  3. Nunca tinha ouvido falar desta tal ecdise vivendo e aprendendo. Prof. seu blog é muito bom não estudei muito mas aprendo cada coisa aqui. O senhor explica de forma fácil. Meu filho foi seu aluno e falou que foi o melhor professor que teve.Suas aulas eram com alma e emoção o senhor sempre exigia 101% do aluno, não ligava pra nota e sim para o interesse o comprometimento a responsabilidade. pra passar tinha de mostrar conhecimento e não decoreba - palavras de meu filho. PARABENS! Ele fala que é profissional competente graças a seu incentivo .

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