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terça-feira, 14 de agosto de 2018

SACRIFÍCIO DE ANIMAIS

No Brasil essa discussão interessa mais diretamente às religiões tradicionais, de matrizes indígenas e africanas, que realizam imolação de animais em seus cultos. Enquanto na Europa e nos USA a questão é com rituais muçulmanos e judaicos, onde os animais são degolados e dessangrados (sem anestesia como nos matadouros), para se obter a carne halal para os muçulmanos e a carne kosher para os judeus.


Estamos diante de uma grande tensão/transformação cultural e religiosa com esse tema do sacrifício em nossa “aldeia global”. De um lado, os sacrifícios religiosos e do outro, a sociedade de consumo e seus frigoríficos.

Sacrifício é o nome dado à matança ritual de um animal ou humano como parte de um culto ou religião. Foi praticado por milhares culturas ao redor do mundo como forma de apaziguar um ou mais deuses ou alterar o curso da natureza; historicamente quase todas as culturas apresentaram, em algum momento, alguma forma de sacrifício, dos hebreus aos antigos gregos e romanos, dos astecas aos hindus. Religiões de matriz africana ainda os praticam até hoje. 
Na Grécia antiga - Eram abatidos animais domésticos, principalmente bois e carneiros. A cabeça era separada do corpo com a machaira (uma espada curta) e colocada no cesto ritual (o kanun). O sangue vertido, era também separado e finalmente o animal tinha suas partes cortadas. As gorduras e os ossos de maior porte, eram separados da carne para serem cremados no altar. As visceras (splanchna) eram grelhadas em espetos pelos executantes e depois distribuídas entre os pesentes, estabelecendo a comunhão entre os deuses e os adeptos. A carne também era preparada e consumida em partes iguais pelos participantes no mesmo local, durante a festa de celebração. Somente a língua e a pele dos animais sacrificados, ficavam separadas com o sacerdote que efetivara o ritual. Era comum que os exércitos levassem cabras em suas viagens, para sacrificá-las antes das batalhas em busca do apoio dos deuses para a vitória. 
O Judaísmo pratica o sacrifício (korban). Sua base teológica é resumida pelo vocábulo hebreu “karov”, que quer dizer “vir para perto de Deus”. Segundo os exegeteas da Bíblia hebraica, os sacrifícios serviam a dois propósitos: selar uma aliança entre Deus e o povo de Israel, e para que Deus perdoasse os pecados (o animal morto estaria sendo punido no lugar do pecador). 
Os muçulmanos se baseiam no Corão (22:37) para agradar Alá com o sacrifício de cordeiros, ovelhas, cabras, vacas e camelos. A matança pretende, além de servir como oferenda a Alá, ajudar os pobres e para reviver a experiência do Profeta Abraão. O ritual do abate animal em sacrifício litúrgico no Islã, é denominado pelos muçulmanos como Dhabĥ. A garganta e as veias jugulares são cortadas rapidamente com faca bem amolada. A espinha dorsal e o pescoço não podem ser quebrados até que o animal pare de se mecher, evitando dor. Este e o único procedimento ritual de sacrifício, sendo rejeitado qualquer outro método. Nessas condições, é então considerada “halal”, e própria para consumo. A carne resultante da matança, é então distribuída entre os parentes necessitados. Contudo, conforme o propósito ou da situação, pode ser consumida pela pessoa que sacrificou o animal. 
O Candomblé os rituais de sacrifício são bastante rígidos e repletos de critérios. Primeiramente, acredita-se que os animais sacrificados já nasceram com este propósito. Razão pela qual, como integrantes da natureza, devem ser respeitados e jamais maltratados. Os sacrifícios são precedidos de rezas que louvam aquele animal e pedem licença para que sejam abatidos. Durante o ato, novas rezas são entoadas para que o sangue vertido converta-se em laços entre os seres e os deuses.
A base do Cristianismo é um sacrifício humano ( Jesus) oferecido para um deus que exigia todo tipo de sacrifícios humanos e animais.
No Hinduísmo, O Yajurveda, um dos quatro Vedas, contém grande parte da liturgia e dos rituais necessários para a prática religiosa hindu. Isto inclui os ritos sacrificiais.
No Paganismo, o sacrifício de animais e seres humanos foi praticado por pagãos de todos os continentes. Muito se tem discutido sobre a condição dos druidas (sacerdotes celtas), se eles eram pessoas pacíficas e simpáticas ou, como nos queriam fazer crer os romanos, bárbaros sanguinários. Já com relação aos Astecas, sabe-se que praticavam rituais de sacrifício humano praticamente diários. Esta era a forma que encontravam para aplacar a fúria do deus Huitzilopochtli, representado pelo Sol, e desta forma evitar catástrofes. Isto os colocava em constante guerra com seus vizinhos, pois com o intuito de evitar o sacrifício de seus próprios, sacrificava-se prisioneiros de guerra. Da mesma forma, os sacrifícios eram praticados na sociedade Maia.



OS CULTOS RELIGIOSOS E O SACRIFÍCIO DE ANIMAIS

Por que Deus exigia sacrifícios de animais no Velho Testamento?
O sacrifício religioso acompanha a história da humanidade, não só de animais, mas de pessoas. Deus exigia sacrifícios de animais para que a humanidade pudesse receber perdão dos seus pecados (Levítico 4:35; 5:10). Quando Adão e Eva pecaram, animais foram mortos por Deus para providenciar vestimentas para eles (Gênesis 3:21). Caim e Abel trouxeram ofertas ao Senhor. A de Caim foi inaceitável porque ele trouxe frutas, enquanto que a de Abel foi aceitável porque ele trouxe “das primícias do seu rebanho e da gordura deste” (Gênesis 4:4-5). Deus ordenou que Abraão sacrificasse seu filho Isaque. Abraão obedeceu a Deus, mas quando Abraão estava prestes a sacrificar a Isaque, Deus interveio e providenciou um carneiro para morrer no lugar de Isaque (Gênesis 22:10-13). É uma contraposição às religiões da época que sacrificavam pessoas para aplacar a ira dos deuses. Mas, o sacrifício dos animais continuou ao longo da história de Israel. O cordeiro da páscoa e o bode expiatório dos pecados do povo são exemplos clássicos. Os primeiros cristãos vão chamar Jesus de “Cordeiro de Deus”, isto é, aquele que foi imolado no lugar de outros.

Por que, então, o cristianismo não oferece mais sacrifícios de animais nos dias de hoje? 
O sacrifício de animais terminou porque Jesus Cristo foi o sacrifício supremo. João Batista confirmou isso quando O viu pela primeira vez: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (João 1:29). Você pode estar se perguntando: “por que animais? O que eles fizeram de errado?” Esse é justamente o ponto: já que os animais não fizeram nada de errado, eles morreram no lugar daquele que estava executando o sacrifício. 


OS SACRIFÍCIOS DE ANIMAIS NAS RELIGIÕES AFRO-BRASILEIRAS


O candomblé abate bichos de diferentes portes em seus rituais. A umbanda, oficialmente, não aceita a prática, mas ainda assim alguns terreiros a realizam. O que justifica essa execução? Usando uma faca, o sacerdote abre a garganta do animal. Na sequência, degola o bicho, que ainda se debate. Algumas partes específicas, como o coração e os genitais, são colocadas sobre um alguidar – uma bacia de barro. Esses pedaços serão oferecidos para o orixá que vai “comer”. O sangue é recolhido e utilizado para sacramentar imagens e instrumentos utilizados no terreiro. Todo o restante do corpo é aproveitado. O couro será usado para fazer atabaques. A carne vira churrasco: os terreiros fazem grandes almoços para os filhos de santo e os visitantes. 

A pergunta é: precisa mesmo? Ainda faz sentido, no século 21, sacrificar animais em nome da fé?
Se nos primórdios da evolução, as religiões executavam seus sacríficos, sejam humanos ou não, em nome dos deuses. É óbvio que faz sentido, é parte integrante dos cultos afro-brasileiros. O sacrifício se constitui em um momento de congregação entre deuses e homens. Merece, por isso, respeito e compreensão. Existem muitos terreiros que, influenciados por outras religiões de origem africana, oferecem galinhas ou bodes para fortalecer entidades, em especial exus e pombagiras. 

Por que matar animais?
Os sacrifícios visam fazer circular a energia que anima tudo no mundo, o axé. Ao se sacrificar um animal, não está se matando uma vida, mas sim fazendo essa energia que anima orixás e homens ser redistribuída. Ou seja, o sangue, fonte de axé, é doado aos deuses.

A lei permite?
Sim, por enquanto. O artigo 5º da Constituição, garante a liberdade para a prática religiosa. Os defensores da manutenção das religiões tradicionais alegam que, para o caso de maus-tratos, em qualquer ambiente, já existe uma legislação vigente, que prevê pena de prisão de três meses a um ano. Os religiosos gritam pelo direito a sua liberdade de culto, e não inverte-se valores, fazendo de pais e mães de santo (sacerdotes de mais alto nível na hierarquia da religião), “assassinos”. A premissa básica da umbanda é a preservação de todas as formas de vida. Jamais, em circunstância alguma, de acordo com seu fundador, faria uso de sacrifício animal. Essa é uma grande diferença entre umbanda e candomblé. Há uma linhagem de interpretação dos rituais de religiões descendentes de africanos, afirmando que o sacrifício de animais nas encruzilhadas era simplesmente um modo de ofertar alimentos aos negros foragidos e que poderiam passar fome pelas matas. Então, tinha o sentido nobre de alimentar seus irmãos em fuga.


O CAPITALISMO E A CARNIFICINA

Mas, não há uma carnificina maior do que a sociedade de consumo como um todo. No Brasil, há mais vacas e bois do que pessoas. Essa cultura provoca o desmate de nossas florestas, alimenta o efeito estufa e ocupa aproximadamente 200 milhões de hectares de terras. A criação de galinhas e porcos em regime intensivo têm que estar prontos para o abate em 40 ou 45 dias, ou então se transformam em prejuízos. O mesmo com os peixes em cativeiro, centenas de tilápias num tanque rede, debatendo-se uma sobre as outras, sem espaço para nadar, apenas consumindo ração para atingir o tamanho do abate. Muitos dizem que esses animais são a proteína barata que o pobre tem acesso. É verdade. Mas, para produzir cada kg de proteína animal, são necessários 10 kg de proteína vegetal. É o hábito humano e o mercado que na verdade dirigem essa produção. A natureza não é vegana. Na cadeia alimentar leões se alimentam de gazelas e hienas se alimentam dos restos deixados pelos leões. Os tucunarés se alimentam de lambaris e outras forrageiras, enquanto as piranhas devoram surubins e curimatãs, mas tem seus ovos devorados nos ninhos pelas piabas. Portanto, o consumo de carne por outros carnívoros também está inscrito na cadeia alimentar.


Em resumo 
Não dá para entender porque o Ministério Público quer condenar a utilização de pequenos animais nos rituais das religiões de matriz africana, deixando livre o sacrifício de animais na religião capitalista. No mundo cultural em que vive a maioria dos brasileiros, com um senso natural/rural das coisas, feliz é a família, seja de qual religião ou filosofia for, que tem uma galinha no quintal pra matar em dia de festa – e nem precisa ser de santo! “Sacrificar” e compartilhar uma criação com os amigos nesse contexto tradicional, é uma autêntica celebração da vida, mesmo fora do ambiente religioso. 
Outra coisa é a sensibilização que talvez já possa ser feita em “Terreiros urbanos”, de que a matéria das suas oferendas públicas (a famosa “galinha preta”) deve se adequar às exigências ecológicas e sanitárias das encruzilhadas modernas, sem que isso diminua o sagrado e o segredo do Axé. A cultura evolui de acordo com o conhecimento.
O sacrifício de animais em rituais religiosos é prática mal vista pela sociedade ocidental de uma maneira geral, tanto devido à crueldade envolvida quanto devido à má impressão visual que causam, associação dessas práticas com feitiçaria etc. O sacrifício está na raiz da maioria das religiões, ele não se configura em um ato isolado de determinado grupo. No entanto, muitas das pessoas que demonizam as religiões onde animais ainda são sacrificados ignoram que a crueldade envolvida no sacrifício de animais é similar à crueldade praticada quando o animal é abatido para consumo, seja por qual método utilizado.
Independente da religião que pratiquemos ou não pratiquemos qualquer religião, devemos procurar nos opor ao sacrifício de animais sem desmerecer o complexo de crenças dos indivíduos. Não deve discriminar uma ou outra religião. As mesmas críticas que atualmente são dirigidas às religiões afro-brasileiras poderiam ser dirigidas a qualquer religião, porque o especismo encontra-se fundamentado em todos os povos, todas as religiões. Porque se dentro daquela crença o sacrifício de animais agrada a um ser divino, aquele que condena esse ritual mas não o ritual diário em torno da mesa nas refeições diárias? Em verdade este crítico se coloca como um ser mais do que divino, a quem o “sacrifício” de animais para satisfação do apetite não fere nenhum conceito moral.




4 comentários:

  1. meus parabéns pela matéria imparcial
    achei muito bem explicativa e de grande utilidade.
    Gostaria de pedir a permissão para divulgar em meu blog, citando o link da fonte original e o autor

    meu whatsaap 51 993 31 6211

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  2. Olá, João Carlos, seja bem vindo.. Sim pode utilizar o artigo. Também encontra-se no blog, outros artigos sobre religiões

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  3. Legal, vou postar lá e passo o link aqui
    muito obrigado, de coração

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  4. Ok. João, fique a vontade para usar qualquer post. Precisando estou a disposição dentro de minhas possibilidades.. Abçs

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