Paisagens do espaço, secura e poucos sinais de vida
Difícil ver sinal de vida ao redor da paisagem de pedras e areia.
O único barulho, além dos próprios passos, é o do vento, que chega frio e com
leve gosto de sal. O imenso céu azul está tão próximo que parece ao alcance das
mãos. No desolado centro do deserto do
Atacama, a sensação é a de que estamos em outro planeta, muito distante do
nosso. O solo extremamente ressecado, até mesmo, é o mais parecido com o de
Marte. A umidade do ar é tão baixa que, aliada à limpeza da atmosfera e à
altitude elevada em relação ao nível do mar, tornou o lugar um dos mais
propícios do planeta para observações espaciais, tamanha é a nitidez com que se
pode observar o céu. Astrônomos do mundo inteiro deslocam-se para lá e montam
seus observatórios. É um dos principais campos de observação para o
desenvolvimento de pesquisas da Nasa. Mesmo sem luneta alguma, porém, as noites
do Atacama tiram o fôlego de quem gosta de uma imensidão pipocada de infinitas
estrelas. Ao todo, essa região árida estende-se por mil quilômetros do norte
do Chile até
a fronteira com o Peru e cobre uma superfície de 106 513 quilômetros quadrados
– grande parte dos quais formados por deserto arenoso
e rochoso. A área que engloba o deserto do
Atacama, no Chile, a 1 300 quilômetros de Santiago, na costa oeste da
América do Sul, esconde um dos meios mais rígidos para o surgimento e
desenvolvimento da vida na face da Terra. Nas regiões centrais dessa estreita
faixa espremida entre o oceano Pacífico, ao oeste, e a cordilheira dos Andes,
ao leste, existem lugares nos quais nunca foram registradas chuvas. A
precipitação anual tem sido abaixo de 3 milímetros nos últimos 50 anos, as
marcas mais baixas do mundo. É o deserto mais
seco da Terra, um lugar onde as espécies estão condicionadas a uma série de
surpreendentes adaptações. As temperaturas oscilam bastante: em janeiro, a
média fica entre 18º C e 25º C; em julho, entre 12º C e 16º C.
Os flamingos rosados, habitantes da planície de sal desse deserto,
o Salar de Atacama, são um bom exemplo de espécie adaptada. Nesse local, a água
que veio da cordilheira dos Andes, formando lagos azuis, evapora mais
rapidamente do que é reposta pelas chuvas, e os sais minerais permanecem. O
resultado é uma quantidade enorme de imensos lagos de sal que impregnam o
organismo do flamingo. A saída que esses animais encontraram foi eliminar o excesso através de pequenas aberturas ao lado das narinas.
Tal qual o flamingo, algumas plantas também dão um jeito de
sobreviver nesse local inóspito. A vegetação de loma, mais importante ecossistema da
região, por exemplo, vive da umidade da névoa que se condensa na superfície das
pedras. Essa neblina, chamada de “camanchacas”, é o resultado da ação da
corrente de Humboldt, que esfria o ar quente do Pacífico durante o inverno. A
consequência biológica também colabora para deixar a paisagem mais charmosa com
a neblina matinal. Poucas espécies animais habitam os lomas. Alguns mamíferos,
pássaros e lagartos.
A lhama, da família do carneiro, é um animal que atrai a atenção
dos visitantes e é bastante presente na paisagem desértica. Infelizmente, um
dos tipos de lhama, o guanaco, que era comum nos lomas e nas áreas costeiras,
está cada vez mais sumido devido à
Os vulcões, na maioria extintos, fazem parte do visual e alguns propiciam o encantador fenômeno dos gêiseres. No vulcão El Tatio, por exemplo,
ele ocorre: as águas subterrâneas encontram-se com a lava vulcânica e, no
nascer do sol, saem jatos quentes de vapor que chegam a 10 metros de altura.
Apesar da secura e pobreza de opções para o desenvolvimento,
diversos grupos humanos ocuparam o deserto durante
os últimos 12 mil anos. Hoje, moram 750 mil habitantes concentrados em cidades
litorâneas, pólos de mineração, vilas de pescadores e oásis. São descendentes
de espanhóis, escravos africanos e índios que saíram dos Andes. O processo de
povoamento da região costeira foi favorecido pela riqueza de nutrientes das
águas da corrente marítima de Humboldt, no Pacífico.
A área próxima ao rio Loa, no norte do deserto,
foi ocupada pelos chinchorros, o primeiro grupo humano a desenvolver a
mumificação artificial. Algumas das múmias mais antigas do mundo (com mais de 9
mil anos) foram encontradas lá. Não é difícil entender o porquê: a ausência de
umidade faz com que artefatos e objetos fabricados há milênios permaneçam em
excelente estado de conservação. Um tesouro para arqueólogos. O aspecto
assustador dessas condições é que há cidades fantasmas nas áreas centrais com
casas onde não moram ninguém, mas que permanecem, por anos, com a mesma aparência
de quando foram abandonadas – a impressão que se tem é de que poucas horas
atrás havia pessoas ali. Para quebrar a estabilidade desse deserto,
só mesmo fenômenos climáticos de larga escala, como o El Niño, que é o
aquecimento das águas do Pacífico. Essa anomalia oceanográfica origina chuvas
na área desértica do Chile e do Peru e afeta ecossistemas terrestres. O nome
foi criado por pescadores e significa “Menino Jesus”, porque aparece geralmente
no mês do Natal.
O “Jesus” dos chilenos e peruanos traz chuvas fortes o bastante
para penetrar o solo e dá origem a um dos maiores espetáculos naturais que
podem ocorrer no Atacama: como em um passe de mágica, sementes que permaneceram
latentes por anos se manifestam com todo o esplendor, numa explosão de cores e
tipos vegetais. É mais uma vitória da vida sobre o deserto.
- Área total - 106 513 km²
- Área intacta - 80%
- Área protegida - 1%
Conservação e ameaça
A natureza única dos ecossistemas do deserto do
Atacama, a presença de espécies com capacidade surpreendente de adaptar-se às
extremas condições áridas e o número significante de plantas e animais
endêmicos fazem desta uma região de grande importância para a conservação. No
entanto, a área protegida é irrisória. Há muitas propostas para aumentar o
número de áreas de lomas a serem protegidas, mas nenhuma foi aprovada. As
atividades de mineração, que contaminam os rios e poços d’água, são um perigo
constante, e o impacto da densidade populacional ameaça as vegetações de lomas
e seu singular ecossistema. Felizmente, as pessoas tendem a fugir das
regiões desérticas e concentrar-se nas áreas urbanas, o que significa que
largas extensões desse santuário devem continuar intactas.
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