É HORA DE RECONHECER A CRISE E DAR RESPOSTAS. Em abril de 1968, em um encontro de dez países, surgiu o Clube de Roma. Esse grupo era formado por cientistas, educadores, economistas, humanistas, industriais e funcionários públicos de nível nacional e internacional.
Um dos objetivos da organização era promover a articulação dos componentes econômico, político, natural e social, que integram o sistema global em que vivemos, para fomentar novas iniciativas e planos de ação. E, basicamente, assinalar os aspectos de interdependência dos diferentes componentes. Em 1972, foi publicado o livro “Limites do Crescimento” pelo Clube de Roma. Foi o primeiro grande alerta sobre os impactos do crescimento econômico e da ação humana sobre o planeta. Esse alerta e a realização da primeira grande Conferência promovida pelas Nações Unidas, em Estocolmo, tornaram-se referências fundamentais no ambientalismo, que surgia como uma nova demanda da sociedade. Um bom exemplo foi a criação do Greenpeace em 1971, por um grupo de pessoas preocupadas com a explosão de bombas pelo governo francês no Pacífico, o que hoje é um dos grandes símbolos da capacidade de articulação da sociedade civil. Atualmente, a entidade tem mais de 3 milhões de filiados em todo o mundo, com presença em 40 países. Seu orçamento provém de contribuições dos seus colaboradores. A ONG não recebe aportes de empresas e governos. Vale lembrar que a Conferência de Estocolmo, de 1972, chamava-se “O Homem e a Biosfera” (MaB – The Man and the Biosphere) e contou com a presença de uma única chefe de Estado, a então primeira-ministra da Índia, Indira Gandhi, que liderou a posição de que a primeira prioridade dos países em desenvolvimento seria sempre o crescimento econômico para combater a pobreza. A presença da sociedade civil, em 1972, era extremamente limitada. Estocolmo se caracterizou pela polarização entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. No dicionário da época, para os países em desenvolvimento, “progresso e poluição eram sinônimos”. O Brasil foi um dos expoentes dessa filosofia – a pior poluição é a miséria –, que passou a fazer parte do Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento. E, mais do que isto, as preocupações com o meio ambiente estariam inseridas em uma estratégia conspiratória dos países desenvolvidos de impedir o crescimento e o desenvolvimento dos países em desenvolvimento. Vale lembrar que o país vivia no auge do regime militar e no auge do “milagre econômico”. Manifestações e movimentos ecológicos eram encarados como subversivos e havia todo um aparato legal que estimulava o crescimento econômico a qualquer custo. Limitava-se, também, a participação democrática da sociedade: polos industriais em muitas de suas atividades eram considerados de interesse nacional e os prefeitos desses municípios eram nomeados pelo governo central. O melhor exemplo dessa situação estava em Cubatão, na Baixada Santista, à época o mais importante polo petroquímico e siderúrgico do Brasil, com maior arrecadação tributária. Por essa razão, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em 1982, para a sua reunião anual, em Campinas, escolheu como título “Estocolmo 72/Cubatão 82”, com o objetivo de alertar sobre os impactos concretos da visão adotada pelo Brasil naquela primeira grande conferência.
a) a Declaração de Estocolmo, contendo
um preâmbulo com sete pontos e 26 princípios;
b) uma resolução sobre testes
nucleares, exigindo que os Estados renunciassem aos projetos dessa natureza e
condenando quem viesse a realizar tais testes;
c) um Plano de Ação para o Meio
Ambiente, composto por 109 recomendações sobre avaliação e gestão do meio
ambiente e medidas de apoio. Estas visavam à organização da comunidade internacional,
conforme os resultados da conferência.
Além disso, a Conferência de Estocolmo
decidiu pela criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
(PNUMA), com sede em Nairóbi, no Quênia, como um de seus órgãos subsidiários. O
PNUMA foi criado para atuar como “consciência ambiental do sistema das Nações
Unidas”. O órgão é dotado de um Conselho de Governadores, composto por
representantes de 58 nações, eleitos para um mandato de quatro anos pela
Assembleia Geral. O Conselho de Governadores é responsável pela avaliação do
estado do meio ambiente global e pelo estabelecimento das prioridades do
programa. Suas prioridades atuais são os aspectos ambientais das catástrofes e
conflitos, a gestão dos ecossistemas, a governança ambiental, as substâncias
nocivas, a eficiência dos recursos e as mudanças climáticas.
Em 1983, as Nações Unidas resolvem
criar a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, também
conhecida como Comissão Brundtland, cujo mandato era o de avaliar os resultados
da primeira grande Conferência de Estocolmo. No momento da criação dessa
comissão, havia baixa expectativa sobre os seus resultados. A iniciativa estava
condenada, de certa forma, a ser mais uma das diversas das Nações Unidas. Além
de relatórios, pouco produzem do ponto de vista político e prático. Entretanto,
uma série de fatos transformou o Relatório final da Comissão Brundtland –
“Nosso Futuro Comum” – em uma grande plataforma para a segunda importante
conferência. Talvez o fato mais importante a transformar a comissão em um marco
significativo do debate iniciado em 1972 foi a divulgação da imagem de satélite
sobre a Antártida, revelando o enorme buraco na camada de ozônio. Em outras
palavras, a dimensão planetária da ação humana sobre o planeta assumia uma face
concreta. A partir daí, a discussão mudou radicalmente de patamar e os meios de
comunicação passaram a exigir dos governos, das empresas e das Nações Unidas
uma atitude mais firme em relação ao meio ambiente e ao planeta. A sociedade
civil, por sua vez, também se encontrava mais presente e preparada do que em
1972 e passou a ser um ator social extremamente relevante no seu papel de
mobilização e pressão sobre os demais atores.
Como resposta institucional aos sinais
da gravidade do problema, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o PNUMA,
em 1988, criaram o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
O painel reúne cientistas reconhecidos mundialmente com o objetivo de avaliar e
compilar dados sobre a mudança do clima. Ao submeter a síntese dos seus
relatórios aos governos, pretende criar os compromissos políticos necessários à
tomada de decisão da comunidade internacional e, fundamentalmente, dos
governos. É importante assinalar que o IPCC não produz ciência. Sua maior
virtude é comprometer os tomadores de decisão com o estado da arte da mudança
do clima no mundo. Caso isso não ocorresse, suas recomendações e conclusões não
produziriam o efeito que hoje realizam, confundindo-se com as centenas de
relatórios científicos publicados diariamente. Assim, a grande crítica dos
denominados céticos de que o IPCC pode ser altamente influenciado pelos governos,
paradoxalmente revela a sua maior virtude…
Enfim, em 1989, as Nações Unidas
convocaram a segunda grande conferência, que tomou emprestado o nome da
Comissão Brundtland, passando a se chamar Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio 92. O Brasil foi escolhido como sede por
várias razões: seu protagonismo em 1972, em nome dos países em desenvolvimento;
a divulgação dos dados de desmatamento pelo Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (INPE), e a morte do ambientalista Chico Mendes, o primeiro mártir
mundial do ambientalismo, em dezembro de 1988.
No que tange a tais circunstâncias,
torna-se necessário esclarecer que, na
agenda do ambientalismo, novos temas ganharam relevância: o conceito de
biodiversidade, a compreender a necessidade de conservação dos biomas e não
apenas espécies ameaçadas, sendo reconhecida a importância da Amazônia como a
maior floresta tropical contínua do planeta; o socioambientalismo, como uma
nova etapa do conservacionismo, com o surgimento de entidades não
governamentais inovadoras, muitas delas articuladas com as correspondentes
nacionais; e o reconhecimento da diferença qualitativa entre o desenvolvimento
e o crescimento econômico, apontando-se Cubatão no Relatório Brundtland como o
modelo de industrialização a ser superado. A partir de 1990, o Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) desenvolveu e passou a divulgar o
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Produtos da Rio 92.
A preparação da Rio 92 se fez em um
período relativamente longo, com a inclusão da sociedade civil e da comunidade
científica, em vários processos negociadores simultâneos que resultaram nos
seguintes produtos
principais assinados no Rio, em junho daquele ano:
a) Declaração
do Rio: conjunto de 27 princípios sobre direitos e obrigações gerais no
âmbito do meio ambiente e do desenvolvimento. Seus princípios refletem o
objetivo da conferência em atingir, por meio de “uma parceria global”, níveis
de cooperação entre os Estados que viabilizem o desenvolvimento sustentável;
b) Agenda
21: Plano de Ação que contém princípios para a implementação de um novo
padrão de desenvolvimento para o século XXI, baseado na sustentabilidade
ambiental, social e econômica. A agenda é composta por 40 capítulos. Apesar de
os 178 países participantes da Rio 92 terem aprovado e assinado tanto a
Declaração do Rio quanto a Agenda 21, eles não se sentiramobrigados a
cumpri-las. Tais documentos não são normativos; eles se enquadram no conceito
de “soft law”, isto é, não criam obrigações legais, de maneira que as nações
signatárias não são obrigadas a cumpri-los;
c) Convenção-Quadro
sobre Mudanças Climáticas: tratado internacional no qual os países
signatários se comprometem a estabilizar, por meio de ações conjuntas, a
concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, determinados a proteger o
sistema climático para as presentes e as futuras gerações. O tratado reconhece
que o sistema climático é um recurso compartilhado por todos e pode ser
prejudicialmente afetado pela emissão de dióxido de carbono e de outros
poluentes. É no âmbito desta convenção que os países se reúnem nas chamadas
Conferências das Partes (COPs) nas quais são estabelecidas e implementadas as
regras que devem ser seguidas pelos signatários;
d) Convenção
de Diversidade Biológica: estabelece normas e princípios que devem reger
o uso e a proteção da diversidade biológica. São três as metas principais: a
conservação da biodiversidade, o uso sustentável de seus recursos e a divisão
justa e igual dos benefícios gerados pelo uso desses recursos genéticos. Vale
lembrar que, até hoje, os EUA ainda não ratificaram a convenção.
As duas últimas convenções são
tratados internacionais que geram obrigações para os países signatários. Vale
ressaltar que começou na Rio 92 o processo de negociação da Convenção
Internacional de Combate à Desertificação e à Seca, tendo esta entrado em vigor
em 1996. Ela tem como objetivos lutar contra a desertificação e minimizar os
efeitos da seca, por meio da adoção de medidas eficazes em todos os níveis. Do
ponto de vista da arquitetura institucional das Nações Unidas, o PNUMA foi
mantido exatamente como idealizado em Estocolmo, tendo sido criada a Comissão
de Desenvolvimento Sustentável, no âmbito do Conselho Econômico e Social das
Nações Unidas (Ecosoc). Torna-se fundamental assinalar que um dos principais
ganhos da Rio 92 foi o processo de mobilização da sociedade civil, que se fez
presente ativamente em todo o período preparatório e participou do evento
ocorrido no Aterro do Flamengo, denominado Fórum Global. Este demonstrou a
vitalidade das organizações não governamentais, de personalidades e líderes de
todo o mundo que criaram um evento paralelo, muitas vezes confundido com a
própria reunião dos governos, a Rio 92, realizada no Riocentro. Costuma-se usar
a expressão Eco 92 para se designar os dois eventos. Mas, o importante nesse
comentário é registrar que, a partir do Fórum Global, a sociedade civil ganhou
uma legitimidade incontestável, passando-se a reconhecer que as sociedades
nacionais não têm, nos seus governos, seus representantes únicos e exclusivos.
RIO 92 E RIO+20: DIFERENÇAS
A Rio 92 é reconhecidamente o grande
passaporte para o século XXI e o seu sucesso se deve a vários fatores: o mundo
marcado por um grande otimismo em função de fatos relevantes, como a queda do
muro de Berlim, o fim do Apartheid com a liberação de Nelson Mandela na África
do Sul, o término da Guerra Fria e o surgimento da glasnost e da perestroika,
na antiga União Soviética. Sobretudo, a liderança extraordinária do
secretário-geral Maurice Strong que, com a experiência acumulada na realização
da Conferência de Estocolmo e com livre trânsito entre chefes de Estado de todo
mundo, conseguiu engajar a sociedade civil e mobilizar a opinião pública. No âmbito
da sociedade civil, destacou-se a capacidade organizativa do ex-secretário da
Comissão Brundtland, Warren Lindner, de organizar o Fórum Global. Por outro
lado, a Rio 92 cometeu alguns equívocos graves: fragmentou o tratamento das
temáticas em convenções, sem prever a necessidade de sinergia entre elas, não
estabeleceu metas quantitativas e qualitativas que tornassem possível o
monitoramento operacional das ações dos países, não criou condições para o
desenvolvimento desse instrumental de mensuração e não alocou os recursos
financeiros necessários para financiar o denominado desenvolvimento
sustentável. A consequência desses equívocos é incontestável: não se conseguiu,
passados 20 anos, avançar concretamente em relação aos problemas que vêm sendo
apontados desde 1972, ficando evidenciado já na Rio+10 – Conferência Mundial de
Desenvolvimento Sustentável, em Joanesburgo, em 2002, a dificuldade em se
implementar as decisões da conferência do Rio. O principal produto da África do
Sul denomina-se Plano de Implementação, ou seja, ali já estava evidente que o
grande desafio reside em se pôr em prática os conceitos acordados
anteriormente. Às vésperas da Rio+20, há que se assinalar algumas diferenças
com a Rio 92. Processo preparatório curto, sem grande “sex appeal”; agenda sem
foco e extremamente difusa, claramente verificável pelo tema da conferência –
Economia Verde no Contexto do Desenvolvimento Sustentável e Erradicação da
Pobreza, e Governança Ambiental Internacional; déficit absoluto de liderança
por parte dos seus responsáveis; e postura de “aversão a riscos” do Brasil, na
qualidade de país anfitrião. Paradoxalmente a este cenário pouco animador, o
patamar de consciência em relação aos desafios é outro: o setor empresarial,
que em 92 assumiu uma postura defensiva e reativa por conta do acidente de
Bhopal, na Índia, em 1984, tem hoje plena consciência de suas
responsabilidades. A ideia do Triple Bottom Line, a interdependência das três
dimensões – ambiental, social e econômica – está disseminada, e iniciativas
como a adoção de relatórios de sustentabilidade e a ampla consulta ao conjunto
de stakeholders têm se transformado em regra usual, tornando o green washing
uma prática perigosa diante de investidores e consumidores. A revolução da
tecnologia da informação, com o grande impacto que as redes sociais têm hoje,
joga um peso muito importante em todo esse contexto, neutralizando, até certo
ponto, o contraponto exercido pela crise econômica europeia e dos EUA, que
drenam a energia dos governos, da mídia e, certamente, das milhões de pessoas
afetadas pelo desemprego e pela falta de perspectiva.
O PAPEL DA CIÊNCIA
Nos os últimos anos, também assistimos
a uma tendência salutar de transformação do papel do consumidor no mundo
inteiro, surgindo a ideia da certificação como um poderoso pacto entre setor
empresarial, sociedade civil e poder público. Ainda que seja necessário
assegurar maior ecoeficiência no uso dos recursos naturais na produção, o
desafio de mudança de padrão de consumo e no estilo de vida com certeza não
será resolvido com facilidade. Vale alertar que há uma expectativa de se
agregar 3 bilhões de pessoas à denominada classe média até o ano de 2030, de
acordo com estudo da consultoria McKinsey. Mas, o que há de mais importante na
comparação desses dois momentos se dá no campo da ciência. Esta,
reiteradamente, está colocando a gravidade da ação da humanidade sobre o
planeta e os processos ecológicos essenciais, demonstrando que a nossa geração
tem uma responsabilidade, sem precedentes, na mudança de trajetória da nossa
relação com o meio ambiente, nas várias dimensões (local, regional, global). Do
ponto de vista da ciência, os relatórios do IPCC têm demonstrado a gravidade do
aquecimento global, a ponto de a própria Conferência das Partes de Copenhague
ter acordado politicamente que o limite aceitável para o aumento da temperatura
média do planeta até o fim do século seja de 2°C. Já no ano de 2006, o
Relatório Stern, liderado pelo ex-economista chefe do Banco Mundial, Nicholas
Stern, demonstrou que a falta de ações no combate ao aquecimento global terá um
custo muito maior em termos futuros. Calcula-se que, com o investimento de
apenas 1% do PIB mundial, seja possível evitar a perda de 20% do mesmo PIB em
um prazo de simulação de 50 anos. No que tange ao tema da biodiversidade, com o
objetivo de suprir a falta de um “IPCC da biodiversidade”, o
ex-secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, convocou mais de 1.300
cientistas do mundo inteiro para a elaboração do documento intitulado Avaliação
Ecossistêmica do Milênio (Millennium Ecosystem Assessment). Esse estudo foi
feito entre 2001 e 2005 e assinalou a importância da biodiversidade e a
urgência de ações para sua conservação. Suas conclusões alertaram o mundo para
o fato de que quase dois terços dos ecossistemas mundiais estão sendo
degradados em razão de nossa maneira de viver. Ao mesmo tempo, além de pontuar
o que é urgente para minimizar esses impactos, a avaliação destaca o valor dos
serviços ambientais prestados pela natureza, tais como água limpa, controle de
enchentes, polinização, sequestro de carbono, estabilização de encostas, entre
outros. Por fim, a Avaliação Ecossistêmica do Milênio é conclusiva: os desafios
envolvendo o aquecimento global, a poluição na terra, na água e no ar, a
escassez de recursos naturais e a aniquilação da biodiversidade, entre outras
mazelas, não vão afetar apenas as gerações futuras, mas já estão afetando a nós
mesmos: as gerações atuais. Apenas a título de esclarecimento, na 10ª
Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica, realizada em
Nagoya, Japão, em outubro de 2010, foi acordada a criação do Intergovernmental
Platform on Biodiversity & Ecosystem Services (IPBES). Também em relação ao
tema da biodiversidade, vale destacar outro documento de relevância internacional,
liderado pelo PNUMA, chamado Economia de Ecossistemas e da Biodiversidade (TEEB
– The Economics of Ecosystems and Biodiversity). Reunindo uma comunidade
internacional variada, composta por economistas, ecologistas e outros
profissionais, o TEEB tem como principal autor o economista indiano Pavan
Sukhdev. Seu objetivo é chamar a atenção para os benefícios econômicos globais
da biodiversidade, destacando os custos crescentes devido à perda desta e à
degradação dos ecossistemas. Além disso, o TEEB disponibiliza ferramentas que
levam em conta os reais valores econômicos fornecidos pelos serviços
ecossistêmicos, sendo considerado um catalisador de mudanças nas áreas da
economia, contabilidade e filosofia. Mais recentemente, outros trabalhos
científicos estão demonstrando que os limites do planeta estão mais próximos do
que se imaginava, a ponto de a comunidade científica estar falando em uma nova
era geológica, a do Antropoceno. Essa expressão foi cunhada pelo geoquímico
Paul Crutzen, que recebeu o Prêmio Nobel de Química em 1995, e refere-se às
mudanças no planeta ocasionadas pelo homem a partir da Revolução Industrial.
Seguindo essa linha, a humanidade teria alcançado uma força geológica capaz de
colocar o planeta em uma nova era. Nesse sentido, os cientistas indicam que as
mudanças climáticas, a erosão dos solos, as ameaças à biodiversidade, a
acidificação dos oceanos, entre outros aspectos, são reflexos da ação da
humanidade, o que faz com que essa nova era esteja sendo moldada pelo ser
humano. Esse assunto foi capa da prestigiada revista The Economist, em 2011
(28/05/2011 – 03/06/2011). Entre os trabalhos científicos mais relevantes, há
que se assinalar também o liderado pelo Stockholm Environment Institute, tendo
como um de seus autores principais Johan Rockström. O estudo tenta colocar os
limites que a humanidade enfrenta em relação ao planeta. Esse assunto foi tema
de um artigo publicado na revista Nature (Vol. 461 – 24/09/2009), “A safe
operating space for humanity”. Os responsáveis pelo estudo identificaram nove
processos existentes no sistema da Terra, cada um associado ao seu respectivo
limiar que, se cruzado, pode gerar alterações ambientais inaceitáveis: mudança
climática; taxa de perda da biodiversidade; ciclo do nitrogênio e ciclo do
fósforo; destruição da camada estratosférica de ozônio; acidificação dos
oceanos; uso global de água doce; mudança no uso da terra; concentração de
aerossol atmosférico; e poluição química. Para cada um desses processos é
preciso definir limites planetários (planetary boundaries).
NOVA ERA DO ANTROPOCENO
As principais conclusões são que três
dos processos acima – mudança do clima, taxa de perda de biodiversidade
(terrestre e marinha) e interferência no ciclo do nitrogênio – já tiveram seus
limites transgredidos. O uso global de água doce, a mudança no uso da terra, a
acidificação dos oceanos e a interferência no ciclo do fósforo já estão
chegando aos seus limites. Aqui, vale ressaltar o tema da acidificação dos
oceanos, que tem ganhado cada vez mais relevância, ultimamente. Por fim,
reforçando as ideias expostas acima, em março de 2012, aconteceu o maior
encontro mundial de cientistas ligados a mudanças globais antes da Rio+20, o
“Planet Under Pressure”. Mais de 3 mil cientistas se reuniram com o objetivo de
identificar, por meio do conhecimento científico, novas soluções para o desafio
da sustentabilidade global. Ao final do encontro, foi elaborado um documento,
“State of the Planet Declaration”, cujas principais conclusões são o
reconhecimento dos limites planetários e o reconhecimento da nova era do
Antropoceno. É importante agregar a isso a maior relevância adquirida pelos
países emergentes, tais como China, Índia, Brasil, África do Sul e México,
trazendo um novo arranjo geopolítico, refletido na criação do G-20, e Brasil,
África do Sul, Índia e China (BASIC), entre outras iniciativas similares que
relativizaram o peso dos blocos negociadores tradicionais como o G-77 e a
China. Em 1992, ou mesmo em 1997, durante a negociação do Protocolo de Kyoto,
era inimaginável, ou pouco provável, pensar que a China se transformaria no
principal emissor de gases efeito estufa do planeta. Desse modo, a divisão
existente na Convenção-Quadro de Mudanças Climáticas entre países
industrializados e não industrializados tornou-se obsoleta, exigindo, neste
momento, a necessidade de se repensar as estratégias de negociação. O tema da
governança proposto como um dos itens prioritários da Rio+20 não tem
apresentado perspectivas positivas até o momento. Como já foi dito, o PNUMA foi
criado em 1972 com objetivos ambiciosos para a época. No entanto, ele nunca
adquiriu prestígio institucional dentro da família das Nações Unidas. Em todo o
processo preparatório para a Rio 92, pode-se dizer que a sua atuação foi
rigorosamente irrelevante.
RESISTÊNCIA A UMA NOVA ORGANIZAÇÃO
Nos últimos dez anos e, especialmente
neste momento, o PNUMA assumiu uma posição mais protagonista, e a ideia de
formulação de Economia Verde é de sua iniciativa. Entretanto, o seu futuro
depende claramente de uma decisão política que venha a lhe conferir maior
prestígio institucional, uma vez que, hoje, seu orçamento é ridículo e as suas
decisões dependem da submissão ao plenário das Nações Unidas. Aliás, as
contribuições por parte dos países ao PNUMA são voluntárias. Do ponto de vista
de arquitetura institucional, há anos encontra-se na mesa de negociação a ideia
de criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente, com o objetivo de
suprir o déficit existente nos últimos 40 anos. A criação da Comissão de
Desenvolvimento Sustentável, em 1992, representa um dos seus maiores fiascos, e
qualquer rearranjo nos mesmos moldes significará, antecipadamente, o mesmo
fracasso. A grande resistência a esta nova organização diz respeito à
necessidade de um novo tratado e a sua respectiva ratificação pelos países, o
que demandaria um tempo exageradamente longo. Na Rio+20, seria desejável e
necessário que o Brasil, como país anfitrião, e pela importância que vem
adquirindo no cenário internacional, nos últimos anos, exerça uma liderança em
favor de uma agenda mais propositiva, em termos de avançar na ideia de se
reconhecer a urgência do momento, relativa aos limites planetários. Para tanto,
a diplomacia brasileira não pode estar presa a velhos paradigmas negociadores e
deve substituir a sua postura de “aversão a riscos”. Existe, claramente, uma
expectativa de que o Brasil venha a ser mais audacioso, o que, certamente,
poderia trazer grandes benefícios do ponto de vista do que se denomina “soft
power”. Em termos comparativos, o país é portador de grandes ativos ambientais,
tais como uma mega biodiversdade, água doce e grande zona costeira. Além disso,
o país também é portador de uma sociedade civil bem organizada e articulada, o
que não acontece em países como a China. Temos também uma comunidade científica
de prestígio internacional, além de um setor empresarial bastante cosmopolita. Por
fim, as expectativas mínimas em relação à Rio+20 poderiam ser resumidas, de
forma não exaustiva, em: fortalecimento institucional do PNUMA ou criação da
Organização Mundial do Meio Ambiente; criação de um “IPCC do planeta”, a
compilar a ciência do mundo em relação aos limites do planeta, com divulgação
de relatórios periódicos; estabelecimento de indicadores de desenvolvimento
sustentável, com o objetivo de monitorar o desempenho dos países, ampliando a representação
de governos subnacionais, regionais e locais; substituição gradual do PIB por
novas métricas, a exemplo do Felicidade Interna Bruta (FIB); criação de
mecanismos inovadores de financiamento para pagamento de serviços ambientais;
eliminação de subsídios para setores altamente intensivos em carbono;
erradicação da pobreza; e combate à desigualdade social.
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FONTE: http://interessenacional.uol.com.br/2012/07/e-hora-de-reconhecer-a-crise-e-dar-respostas-o-que-se-espera-do-brasil-na-rio20/#more-774
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