Na imensidão de gelo, espécie rara é o ser humano
Muito pouco além do branco e azul infinitos enchem os olhos de
quem tem coragem de ir à Antártida. Destino inóspito até para os mais
aventureiros, é o único continente na Terra que o homem não conseguiu
conquistar. Um lugar em que 98% da superfície estão cobertos por uma enorme
capa de gelo
de milhares de metros de espessura. Um lugar com temperaturas abaixo de 0° C no
verão e abaixo de -25° C no inverno. Fácil entender por que lá os seres humanos
são espécie rara.
Antes do caçador de focas americano John Davis pisar lá, em 1821,
não se tem notícia de povo algum habitando a Antártida, nem mesmo indígenas.
Desde Davis, o que se acumulou de gente vivendo no continente gelado é
basicamente uma população internacional: pesquisadores de diversas áreas do
mundo, inclusive do Brasil, concentrados na costa e nos arquipélagos próximos
ao continente. No verão, o número de habitantes chega a apenas 10 mil e, no
inverno, não passa de mil. Só nas últimas décadas a locomoção foi facilitada,
com botes infláveis movidos a motor.
PINGUIM IMPERADOR
O prazer de ver paredes de gelo gigantescas
com formatos inusitados vem inevitavelmente acompanhado de um frio seco e muito
vento gelado batendo no rosto (com a possibilidade de, do nada, sofrer o
impacto de um vendaval de 100km/h e força de furacão!). Pode-se considerar a
Antártida um deserto, já que é o continente mais árido do planeta. No verão, a
luz do sol perdura por até 20 horas seguidas. No inverno, ao contrário, se vê
escuridão a maior parte do tempo. A paisagem não depende das horas para se modificar, mas do humor
do clima, por isso o perigo é iminente em todos os cantos. Esqueça do relógio e
conte com alguém que saiba se orientar pelos satélites. Uma tempestade de névoa
pode anular a visibilidade do lugar em minutos e transformar uma simples saída
de barco num passeio sem volta. Geleiras formam-se rapidamente entre os
caminhos e, se o aventureiro não prestar atenção, fica perdido mesmo a alguns
poucos metros de seu destino. As condições extremas de permanência na Antártida mais o silêncio,
o excesso ou falta de luz e uma beleza de poucas cores podem perturbar o
equilíbrio psicológico de seus visitantes em poucos meses. Pesquisadores estão
sujeitos a crises de estresse. Mas, apesar de remota e hostil, a Antártida é
rica em vida selvagem, paisagens de tirar o fôlego e reservas naturais únicas.
PINGUIM REI
Quase 100% do local ainda estão intactos e há muito mais
biodiversidade dentro da água do que fora dela. A vida animal em terra é
dominada por invertebrados, a maioria deles parasita de animas de sangue
quente. Todas as 18 espécies de mamífero são total ou parcialmente marítimas,
como as baleias e as focas, respectivamente. Os pássaros dominam a cena. São
cerca de 100 milhões de indivíduos competindo pelos melhores lugares para
arrumarem seus ninhos durante a procriação. Há sete espécies e oito categorias
do cativante pinguim, um dos animais-símbolo do continente. O pinguim-imperador
é o maior de toda a espécie no mundo – chega a pesar 30 quilos e a medir 1,15
metro de altura –, e o pinguim-rei, o segundo maior. Suas colônias estão entre
os grandes fenômenos da vida selvagem na Terra, chegando às vezes aos milhões
de indivíduos.
KRILL
O ecossistema marinho é extremamente produtivo, o mais
rico do universo e mostra seu potencial principalmente no verão, a estação de
crescimento na Antártida. Com quase 24 horas diárias de sol (a propósito,
enlouquecedor até para os mais acostumados), o fitoplâncton floresce e se
afirma como base da cadeia alimentar. Alimenta o krill, um pequeno crustáceo
que, por sua vez, serve de alimento para pássaros e mamíferos.
Apesar de seis meses de luminosidade por ano, o continente ainda
esconde muitas áreas completamente inacessíveis, como um lago que fica embaixo
de uma camada de gelo de 3 quilômetros de espessura, na Estação Vostok,
base científica russa a 2 mil quilômetros do Polo Sul. Não se tem ideia do que
realmente pode ser encontrado em suas profundezas – 14 mil quilômetros
quadrados de puro mistério (quem sabe animais pré-históricos congelados há
milhares de anos?).
Por um lado, a inacessibilidade pode parecer um obstáculo ao
conhecimento. Por outro, sorte do meio
ambiente. Enquanto outros santuários ecológicos correm riscos imediatos de degradação,
a Antártida deverá ser por muitas décadas a última fronteira do planeta para os
homens.
- Área total - 13 900 000 km²
- Área intacta - 99%
- Área protegida - 0.025%
Conservação e ameaça
LÍQUEN AMARELO
As mesmas condições selvagens que nos encantam são responsáveis
por boa parte da conservação ao criar um ambiente inóspito para a instalação de
grandes populações. Os tratados assinados pelos países que lá mantêm suas bases
também têm contribuído decisivamente para sua preservação. Dois grandes acordos
regulam as atividades humanas no continente: o Tratado da Antártida, de 1961, e
o conhecido Protocolo de Madri, estabelecido em 1991. O primeiro, assinado
originalmente por 12 países, determinou principalmente o uso pacífico da
região, proibindo os testes nucleares, e reafirmou sua condição de território
livre – a Antártida não pertence a nenhum país. A exploração mineral foi
terminantemente proibida como também qualquer atividade que venha a colocar em
risco as espécies ameaçadas. Há ainda vários anexos referentes à avaliação de
impacto ambiental, conservação da fauna e
da flora[ continental consiste
em liquens, briófitas, algas e fungos],
coleta e tratamento de lixo, prevenção de poluição marinha e criação e
gerenciamento de áreas protegidas. Mesmo assim, a Antártida ainda sofre
ameaças. As principais são: introdução de espécies não nativas, a pesca do
krill e a exploração de minérios e óleo. A mais severa, no entanto, parece ser
o impacto do aquecimento global. Se as temperaturas continuarem a subir, uma
parte do gelo pode
derreter, com consequências drásticas para áreas mais baixas em todo o planeta.
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